sexta-feira, 15 de junho de 2012

                      Homendigo se explica
ao bêbado:

"meu trabalho não é feito pro técnico
(o que armazena as palavras,
enfeita suas frases
e reduz seus ouvintes
e seleciona leitores
de acordo com o intelecto);
meu trabalho não é feito pro empresário
(o que sonega os impostos
e explora o empregado -
que compra um carro
e tv de plasma
e se põe satisfeito);
meu trabalho não é feito pro chefe
(o que se faz autoridade
falando alto
e quando chega na rua
vira a cara pro chão
pois passou a ser ´mais um`;
meu trabalho é feito
para os que precisam se rebelar.
é feito contra a desinformação.
portanto, se por aí se encaixarem,
podem levar.
não precisam pagar.
vamos trocar."

terça-feira, 21 de junho de 2011


aquela manhã trouxe nos ventos
palavras e espantos e sementes
caindo sobre a terra afofada e adubada...
eu quase podia ouvir as pedras retiradas
e postas de lado como seres inanimados,
repetindo ladainhas por uma suposta separação:
"--nós ajudamos na drenagem do solo,
não nos jogue para muito longe!!!"

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010


um verso sempre cai bem
pra tua imagem que surge
quando menos espero,
mas mil versos em verdade
explodem dos meus dedos
e todo o corpo sangra
e todo o mundo vive
do encontro dos desejos;

e o verso absorve
o que há de bom
e o que há de ruim
e mais do que a hora
eu aguardo o segundo
d'onde surjas em silêncio
tocando os meus lábios
pedindo um beijo.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010


sempre moveu horizontes e verticais

e prevendo o futuro

fingia abrir a boca e nada mais;

de tudo o que parecia ser verdade

a única coisa que realmente importava

era a sua pseudo sanidade.


a miséria na sua cabeça,

todo mundo dizendo “esqueça!”,

as flores nascendo numa primavera de morte

e embrulhadas em jornais velhos

com notícias pesadas e arquitetadas

por gente super do clube do dinheiro...


e os carros agora passam por cima

daquilo que parecia ser o seu corpo...

decomposição adiantada pela angústia

de estar sozinho na beira do penhasco,

olhando pra baixo e vendo o grande imã,

a pedra pontuda, em direção indefinida.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010


sempre achei legal o fato de ter um coração,
até o dia em que o reconheci
como um órgão sem função...

dia e noite, noite e dia
e mais madrugadas e tardes
e todos os instantes,
tudo somado, cada segundo
ao zombar dos olhos atado,
o que eu era agora
não queria ser mais,
pra que o meu coração
voltasse a ter função;

ah, merda,
perdi.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010


a vista alcança até onde a vista
alcança do real:
pedaços fora de foco
desfocam o seu lado animal.

segue outra vez a sonoridade
de seus próprios pensamentos,
sem que de outras penúrias
sejam arrancados incrementos

e na cabeça assim se firmam,
autônomas, as esperanças astrônomas,
na busca perpétua por outros céus
e ruas onde corram outros ventos.


Veio na pasta sonora
Embutido com leveza
De bigorna de desenho
Animado com destreza;

Imagem incomum
Sugerida nos sentidos,
Distorcidos ao extremo
E de muito caos vestidos,

Com miséria discrepante,
Sem esmolas prometidas,
Sem múltiplas vontades;

As zebras anuladas
Pela cabeça pensante
Das meias-verdades.


Vagam sem um consciente nexo
Estas setas indicando os caminhos,
Mas um astuto e atarefado paralelador
Vem interferir na desordem natural sozinho,
Satisfazendo a incômoda vontade
E a atraindo para uma morte à tarde
Na primeira nuvem que passa,
Transferindo côncavos movimentos
Para os confins de um convexo meio,
Aparentado e munido de instrumentos
De curto pavio e longo alcance,
Sem que seja precisa a última chance
Nem dúvida que seja demais da conta
Ou da cabeça, cuspida com facilidades
De saltos sem gravidade
Na peculiaridade de instintos
Mornos e sensatos,
Ao coração eternamente gratos
Pela múltipla função percebida,
Sem muita barra forçada
Nem resoluções descabidas.

Segue a estrada
E logo adiante um acidente
Paralisa o bater dos dentes.

A mesa não mais abriga
Um corpo pronto para a autópsia,
Mas alimento sincero,
Límpido, sem paradoxia
Nem caramelos
Nem doces em manhãs frias.


O que teu sonho viu
A realidade impediu ,
Você resolveu mentir
Para se redimir

Pra si mesmo,
Com receio
E recheio
De agressão.

Mas meus olhos secos
Vêem a alma,
Perdem a calma
E colhem o esterco.


O real
Tão surreal
(Com gosto de sangue
Da ponta do bumerangue)

Martela a cabeça
Dizendo: “esqueça!”,
Molhado na mesa
Para depois da sobremesa.

O que sobra
É para amanhã,
A dobra
Da romã.


avita ssi bannac
asu e dah nimé
amla caem meuqé
zilef zafem meuqé



plante a planta

que ela em resposta

seus males espanta


segunda-feira, 9 de agosto de 2010


a fúria começa por dentro da ordem,
corroendo a história e a cadeia;
cada movimento vem disposto,
corte ao acaso dos motivos.

o passo que se faz veloz
subitamente presta ao martírio
a sombra benemérita
dos algozes pútrefos;

e mais um verso de exílio
impõe um sorriso à boca
(desdentada em sonhos)
do poeta esquecido,

e mais uma golfada de vômito
espalha o aroma dos restos
ingeridos pela cidade afoita
na proximidade dos festejos.

segunda-feira, 19 de abril de 2010


nem bem abriu os olhos, tudo se apagou. aqueles poucos instantes já significavam muito para ele, que vinha de dias e dias de buscas infrutíferas pelo arbusto sagrado. percebeu então que era isso, de olhos abertos as luzes acesas causavam uma sensação de segurança, enganado que estava em dar méritos à visão privilegiada. em verdade, a escuridão podia lhe ensinar algo. nem bem abriu os olhos, teve vontade de fechá-los novamente e abstrair daquelas caras que o observavam faziam tantos dias.
de olhos fechados abriu suas asas e saiu a sobrevoar a cidade, como já tinha feito tantas vezes. atingia uma velocidade muito maior que a de um avião por ser bem mais leve, relativamente. viu à sua frente alguns urubus bailando e perguntou se poderia aprender um pouco daquela dança, no que recebeu resposta afirmativa. ninguém acreditaria quando contasse!
a dança durou horas, o tempo da descida até o cadáver em putrefação. sem experiência na arte da bicada, aguardou o início do banquete. despedaçada a carne, os olhos caíram aos seus pés e ele nem pensou: abocanhou. recebeu abraços calorosos e fedorentos dos amigos alados, que prometeram convidá-lo para o próximo lanche, mas naquele momento precisavam sair a acudir parentes que não gostariam de saber que eles tinham como novo companheiro um humano, vivo principalmente.
cheirou os suvacos e só lamentou ter ganhado além do conhecimento um banho de essência de urubu. bateu as asas e subiu aos céus outra vez. só não percebeu que o mundo estava invertido, entrou num buraco de esgoto e viu deus numa ratazana. barbuda também, como nos filmes. mas não branca, preta. molhou as asas e elas ficaram pesadas e ele percebeu que demoraria para sair dali, o tempo de secagem delas num ambiente úmido.
deus o convidou para conhecer as galerias do céu e seus sentinelas. prometeu que secaria suas asas com um sopro, mas ele teria de passear e ter o desejo real de novamente voltar a voar.
enquanto isso, os seres no asfalto continuavam a caminhar e a vender suas horas, um terço de seus dias no mínimo.
e ele continuava dormindo, imaginando qual seria a sua real vontade naquele instante sem relógio.


e vem chegando a hora
sem minutos
nem segundos,
a hora instante
do mundo acabar:

os erros amortecidos
bagunçam os passos.

o adeus preparado demais
provoca a ira,
derrama gotas
de fúria
ao avesso:

desligo a luz
pra pensar melhor.

quinta-feira, 8 de abril de 2010


pra seu governo,
não sou governado por ninguém.

segunda-feira, 22 de março de 2010


cometa o erro
de não ter certeza
de si mesmo


e mande
os moralistas

pra casa do carvalho

onde eles podem,

prudentes,
viver como serpentes

sexta-feira, 19 de março de 2010


um pouco de boa música...


terça-feira, 19 de janeiro de 2010


a frase dinamitada -
uma oferenda aos ouvidos.
gostaria de ser surdo
por um momento apenas,
o do segundo crucial;

ao ver as chamas do sussurro
invadindo a caverna
e o som pairando inerte,
vomitei mais um pouco
de ervas daninhas
por sobre a roupa branca
do indigente aflito
que arrumava seu narcisismo
na frente daquele espelho
quase partido;

calado enxuguei o desafeto
e raspei das paredes da mente
a overdose clandestina,
o ronco, o desafio
na surdina.


quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

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sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

"A Apoteose de Homer" - Salvador Dali

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Tantas e quantas

Lutas inacabadas,
Plantas arrancadas
Em favor de um futuro de frustrações mascaradas;


Overdose de insensibilidade
Em cápsulas de teorias armazenada,
Doença que mata lenta
E subitamente.


Uma vírgula ou um ponto,
Surge um novo sentido
Para o conto;


Um grito a mais,
Mudanças nas leis,
Novas estruturas radicais.


A distância é imprecisa,
O porto inseguro.
Um caminho que desaba
Quando os olhos, atrevidos,
Anseiam um olhar para trás.

Fatos que a memória teima rasgar
Do diário dos grandes acontecimentos,
De músculos contraídos pelo frio cortante,
Contas perdidas
De cálculos enigmáticos.

Doces teorias para lábios sedentos,
Angústias para sonolentos...
Pedidos de socorro
Em meio ao maremoto estonteante
De resguardadas proporções.

Posso ser eu, ele, você,
Misturando idéias num só corpo,
Um copo de esgoto,
Um prato de comida barata
Para o morto;

Satisfazendo nada nem ninguém
Com comentários inúteis,
Soturnos, patéticos,
Como as pálpebras
Que me guiam.

domingo, 29 de novembro de 2009


VEGETANDO

Dos mundos
Ao pé do sorriso em desespero,
Uma tentativa de marcar o nome
No início de uma tal supremacia.

Vegetando,
Nunca os ventos fizeram tanta falta.

Das aparências
Ao fechar dos vidros de benzina,
Um segredo para aleijar o homem
No absurdo de uma tal irreverência.

Vegetando,
Nunca a minha miséria foi tão angustiante.

Das vertigens
Aos planetadores insanos no inverno,
A abertura dos olhos traz pânico
No caminho de uma tal antecedência.

Vegetando,
Nunca os meus sonhos estiveram tão dispersos.

(Planetador - Mergulhando na Brasa... / Maio/2001)



Toda Arte Pode Falar de Amor

Tento apenas me espalhar por aí
De uma maneira tal
Que ninguém possa me rearrumar,
Para que amanhã eu não seja mais
Tão igual a você.

Tento apenas me espalhar por aqui
De uma maneira desigual,
Para que ninguém possa me reajustar
E para que eu nunca precise
Me achar “o tal”, como você.

Tento sempre me espalhar por acolá
De uma maneira anormal,
Para que ninguém possa me reintegrar
E para que ainda assim
Eu possa ser vital para você.

E para que possamos
(Mesmo com as diferenças)
Sermos vitais uns para os outros.


(Planetador em Pedaços - 02/2001)


sexta-feira, 13 de novembro de 2009


LEI DOS DEDOS


Na frente de cada dedo,

Uma auto-definição realizada.


(Planetador - O Último Suspiro - 05/2002)


O RESTO DO CAMINHO

Quando os olhos se abrem,
Tudo o que acabou de acontecer
Vira apenas mais um risco
E o sorriso que antecedeu a lágrima
Deixa de se perpetuar;

O resto do caminho torna-se então nebuloso
Como o teu beijo deste instante.

Quando os olhos saem do transe,
A água já evaporou de meu corpo
E teu sangue passa a ser a esperança
De que nossa piscina
Continuará a ser utilizada;

O resto do caminho torna-se então uma incógnita
Como o teu silêncio deste instante.

(Planetador em Pedaços - 02/2001)


sexta-feira, 6 de novembro de 2009


O Conto sem Fim

o camarada e a moça cruzaram-se pela rua principal da cidade. ele numa calçada, ela na outra. por alguns instantes fitaram-se olhos nos olhos, ela com a sensação de já tê-lo visto em algum lugar, ele com a sensação de que ela já o tinha visto em algum lugar.

pela rotina que a vida traz, ele entrou num bar e pediu ao balconista um cigarro, derby vermelho.
pela repetição monótona dos dias ela parou em frente a uma loja de roupas e ficou observando a si mesma no reflexo do vidro, encaixando-se em cada roupa de casamento.
o camarada pegou o jornal que estava no balcão e na primeira página, a tragédia: "marido mata a mulher estrangulada com um fio de cobre".
a moça entrou na loja e escolheu seis vestidos, sem experimentar. entregou seu cartão de crédito à vendedora, que empacotou as roupas e agradeceu a preferência. a moça saiu rua afora, atravessou a larga avenida e foi sentar-se à sombra de uma frondosa mangueira.
o camarada saiu do bar, disse ao balconista que naquele dia ia dar mengão na cabeça, pediu se podia ficar com o jornal, e diante da resposta positiva do dono do bar, foi até a praça para sentar e dar uma lida antes de ir cumprir suas tarefas diárias.
a moça procurou um isqueiro na bolsa e viu que não havia. pra que teria um isqueiro ou algo que fizesse fogo se nem fumava? ninguém anda com isqueiro na bolsa só pra atear chamas às vestes...
o camarada sentou-se no banco e viu aquela moça ao seu lado, procurando algo na bolsa. nada disse.
a moça olhou de relance pro camarada e o reconheceu. algo brilhou em seus olhos.
o camarada viu aquele brilho e lembrou do brilho do cobre e da reportagem da primeira página do jornal daquele dia. soltou um arroto com sabor de café e olhou pra moça pra ver se ela tinha sentido o cheiro.
e a resposta foi positiva, o polegar e o indicador da moça tapando o nariz. "você tem isqueiro?", ela então perguntou.


Um Novo Dia de Sol

após dias e dias de chuva, o sol resolveu voltar a mostrar sua força. as raízes das plantas da horta do camarada salvaram-se do apodrecimento por muito pouco, contou ele ao rapaz que estava sentado ao seu lado naquele ônibus lotado. o rapaz parecia não estar ouvindo nada, mas mesmo assim o camarada falava e falava sem parar. sua alegria era muita.

para a moça não fazia a menor diferença se o sol estava de volta ou não. ela até preferia os dias chuvosos, romantizava-os ao extremo. de dentro do quarto, deitada na cama, cortinas fechadas, ela ouvia o barulho dos carros e até chegou a pensar em levantar e dar uma volta, mas que nada... a preguiça não deixava. não saía de sua cabeça a imagem do camarada. em verdade, não lembrava dos detalhes daquele rosto, mas ainda sentia a sensação pelo corpo, a sensação energética, o calor que emanou da imagem dele na rua.
o ônibus passou direto pelo ponto onde o camarada iria saltar, e ele nem percebeu. o rapaz ao seu lado dormia e ele continuava falando das suas plantas na horta, com um sorriso de orelha a orelha.
num canto do quarto da moça, uma aranha tecia uma bela de uma teia, torcendo pra que algum mosquito ficasse agarrado a ela. estava com fome.



o camarada acordou cedo e separou a roupa com a qual sairia alguns instantes mais tarde para mais um dia de caminhada.
a moça dormiu cedo naquela manhã para acordar quando desse na telha.
o camarada foi até a janela de casa, apurou a audição para ouvir somente o canto dos canários soltos que teimavam em pousar na aroeira que ficava sempre parada na porta da sua casa. parecia que seria um bom dia. a água pro café já borbulhava na leiteira.
a moça escovou os dentes, olhou suas olheiras no espelho. pensou no camarada, pensou em quando se daria aquele encontro já tão esperado. sabia que a coragem e o medo caminham juntos. não sabia qual dos dois levaria adiante.
um cachorro leproso lambia os restos de acém jogados na porta do açougue onde o camarada não mais comprava carne. o dono fumava um cigarro enquanto cortava peças de picanha em bifes suculentos. moscas e baratas, possíveis de serem vistos, enfeitavam o ambiente. as sombras do dia eram o engano da nuvem naquela tarde sensível.
a moça sorriu pra si mesma, beijou o espelho e viu o rosto do camarada por cima do seu. começou a ter a sensação de estar enlouquecendo. foi até a cozinha, abriu a geladeira e procurou o quiabo cozido da noite anterior. quando abriu a panela esquecida, fungos já tomavam conta do alimento. ela não percebera, mas não comia há dias.
o camarada saiu para o trabalho, mas antes regou a horta e cortou as folhas amareladas pela falta de nutrientes.


Sol


o camarada não havia dormido nada na noite anterior, nada mesmo. acordou cedo naquela manhã, tomou um café requentado e reforçado e partiu pro trabalho forçado e escravo de cada dia, pra poder no final do mês ganhar aquela miséria que o chefe chamava de salário.
a moça havia dormido bastante na noite anterior, bastante mesmo. acordou tarde naquele dia, almoçou a comida fresquinha feita pela vovó querida e partiu pra dar uma voltinha pela praça, para ver se encontrava outra vez com o rapaz do dia da chuva. não precisava trabalhar, alguns parentes queridos haviam deixado uma boa soma pra garantir seu futuro, e ela gastava pouco e vivia investindo em fundos de bancos. trabalhava sim, mas só pra não ficarem falando dela no bairro onde morava.
o camarada, na hora do almoço, resolveu ir até a praça dar uma voltinha. comprou seu já clássico pão com mortadela e foi se sentar à mesa dos velhinhos do xadrez. a rotina já o incomodava, ao menos os velhinhos já não eram os do dia anterior. sábado de sol, podia estar na praia, mas não.
a moça viu o rapaz e o sol iluminou seu rosto...


Chuva

a chuva caía fininha, sem parar, na cidade histórica. o camarada caminhava sem guarda chuva, com os dois tênis furados, pulando as poças que cruzavam o caminho... comprou cem gramas de mortadela e três pães de sal na padaria do maneco e foi até a praça. sentou no banco dos velhinhos do xadrez (um xingava o outro, a derrota doía) e preparou os sanduíches. mal começou a comer, a chuva apertou e começou a molhar pão, mortadela, os velhos, os cabelos do camarada e as peças do jogo. rei e rainha de papel machê.
o camarada queria acender um cigarro, mas a chuva caía e não haviam marquises na cidade. queria fumar uma erva mas haviam policias demais nas ruas, nem um congoblue adiantaria.
enquanto isso, da janela de um prédio que ficava bem próximo à praça, a moça observava os atos do camarada e dos velhinhos. com os dedos digitava algo no teclado do computador e com os olhos alternava entre praça e tela. perdera a hora do almoço e, como não havia almoçado, sabia que demoraria a sentir vontade de cagar. levantou, caminhou até o bebedouro, tomou três goles daquela água com gosto de metal e voltou aos seus afazeres: um olho na tela, outro na praça. mas o camarada já não estava mais lá.
na porta de um bar, os dois velhinhos se atracavam. o camarada chegou perto, viu a carteira de um deles cair no chão, veio se aproximando e pegou sorrateiramente a ditacuja. ninguém deu atenção ao fato, todos estavam interessados mesmo no embate.
o camarada saiu andando na direção do ponto de ônibus, abriu a carteira e dentro dela haviam algumas fotos de crianças jogando bola, um vale-idoso e receitas médicas. segurou para si apenas a que receitava o viagra. o resto jogou na lata do lixo.
a moça da janela procurava e procurava, mas a neblina começava a tomar conta da praça e ela não conseguia ver mais quase nada. seus olhos estrábicos permaneciam um na tela, outro na neblina. e da neblina então saiu uma borboleta, que pousou em seu nariz e a beijou.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Ramon Aguirre
aguirreartesvisuais@yahoo.com.br
(nankim e escova de dentes)


todo o alimento que trouxer satisfação,
vindo de qualquer lixo, da esquina
de qualquer restaurante, lavando
a azia da fome com água de esgoto

sem suprir a carência de vitaminas essenciais
a um bom desenvolvimento físico e mental,
cada um deles representará um ideal a florescer
com mesmo sabor e na mesma quantidade

num mundo utópico
e cada vez mais e mais
distante,

deixando o que resta
para o que presta
neste mundo constante.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009


Aurelinho, o coitadinho...
(um poeminha simples)


um pobre coitado
a vagar pelas ruas
com a sua meiota
e uma cara de idiota

por onde ele passa
despeja impurezas
mangueia até água
fingindo ter mágoa

de toda a humanidade...

o pobre aurelinho
está sempre cansado
está sempre com fome
e se garante no sobrenome

mas com homendigo não cola...

agora está em fuga
não tem responsabilidade
nunca foi um homem
vive como muleke

mas uma hora dessas aprende
nem que seja na porrada
(e a vida não perdoa
os que vivem pra nada).

segunda-feira, 28 de setembro de 2009


numa esquina bosta de cavalos
noutra esquina bosta de cachorros
num cantinho bostas humanas...

espalhados vigilantes assíduos,
de todo o tipo passa gente por lá.

liberdade controlada,
no big brother que é BH.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009


não era pra ser assim

nem muito menos pra ser assado
queria mesmo que fosse cozido
aquele coração maltratado


quarta-feira, 16 de setembro de 2009


Ouçam...

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

por Ramon Aguirre
aguirreartesvisuais@yahoo.com.br

(colagem)


por Ramon Aguirre
aguirreartesvisuais@yahoo.com.br

(bico de pena e nankim)


para a cabeça a obviedade

é como um parafuso apertado
e nós no deserto
sem chave de fenda ou philips

recuperando as memórias soltas no tempo,
arrumando os pedaços,
o novo jogo
das crianças grandes.

recuperando o que havia passado,
torturando a si mesmo
no sol poente
outra vez.

recuperando a luz enfadonha
que de natureza
nada tem,
cansativo vaievém.

recuperadas as náuseas
de há tanto acumuladas,
fossas abertas
para surpresas e misérias.


história louca do dia a dia:

o resto da história inteira
não vem aos ouvidos, aos olhos
ou a qualquer órgão sensorial,

nem vem de memória ou reverso
o passo (canseira ou regresso)
a um mundo que se propõe animal;

regam-se afora as sementes
para que brotem das gentes
orgias e flores do mal,

com pústulas sempre presentes,
mágoas nunca ausentes
e vômito corporal.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009


INSTANTE

da eternidade que se espera,
dos anos que correm aflitos,
a memória escondida
rejeita as cores;

do momento que se esvai,
do instante que se perde,
a memória fatalista
exagera amores;

e as flores que renascem
em cada primavera
instigam aquele obscuro
e severo desejo de espera

e as dores que caem
dos olhos da fera
alteram em nada
a rota da terra.

quarta-feira, 1 de abril de 2009


voltei...

domingo, 17 de fevereiro de 2008


Uma Propaganda Esquisita

Um homem corre na praia
em direção a uma coxinha
de galinha;
outro homem chega em casa
e entrega rosas a uma pizza
(que o espera feliz)
e ganha um beijo
de gordura;
uma mulher num parque de diversões
abraça feliz um cachorro-quente
(melado de maionese e catchup)
e um demonstra amor pelo outro;
e tome remédio
vendido em farmácia
pra reduzir os danos
nos de sensível fígado.
Famílias abraçadas
dizendo contentes
que não mais precisam
sair de seu bairro
pra nada;
colocando-se em caixas.
DESISTA DA TV

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008


uma história nunca é completa.
uma história nunca tem fim.
uma história sem começo
são instantes transbordantes
em cada existir,
seja humano
ou seja pedra.


o foguete vai partir
não se sabe bem pra onde
nosso mais novo mistério
se formando em outra praça,
outro mundo gente nova
(mesma gente no abstrato)
retomando o ar da graça
quero ser um bom palhaço

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008


George Harrison com Gilberto Gil
Na minha cabeça
Deu George Benson.

sábado, 15 de dezembro de 2007


O Verdadeiro Canalha
(Jorge Mirim/Sergio Fernandes/Rodrigo)

canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha.
você vive de trambique,
deita na sopa
e se atrapalha,
olha aí, seu canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha.
se elegeu com votos da favela,
depois mandou nela
metê bala,
isso é que é ser canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha.
afinou o dinheiro do povo,
saiu esbanjando
e fazendo bandalha,
veja bem, seu canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um tremendo canalha.
comprou carrão,
fazenda e mansão
e o povo na miséria comendo migalha,
veja bem, seu canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha.
está livre a poder de propina,
porém a justiça divina
não falha,
veja bem, seu canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha.
o truco se acaba
meio retrocesso,
verás o reverso da medalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdaderio canalha.
viver de moleza é muito bom,
quero ver você
encarar uma batalha,
vai trabalhar, canalha!
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha.
e no dia do judas tu fica na tua,
se tu for pra rua
a galera te malha,
fica em casa, canalha!
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha.
comeu, bebeu, fumou e cheirou,
depois caguetou
o cabeça-de-área,
olha a bala, canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha.
nunca vi ninguém dá dois em nada
e também se ver
cadeado não fala,
aprendi isso, canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha.
e depois daquele par de chifres
em que altura está
o meu chapéu de palha,
já viu isso, canalha?
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha.
o calado tá errado...
e falando nem se fala...
cala a boca, canalha!!!
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha.
de repente o bicho pegou,
tu se empirulitou
e jogou a toalha,
sai correndo, canalha!!!
canalha, tu é um verdadeiro canalha...
canalha, tu é um verdadeiro canalha.
----
(do álbum "contra o verdadeiro canalha",
bezerra da silva - 1995 - RGE)